domingo, 5 de setembro de 2010

TEXTO DE JOSÉ SEGAL

Um dia, trocando idéias com meu pai sobre como se pode fazer o bem com um pouco de inteligência, meu pai contou-me que, quando jovem, tinha, em Friburgo, uma loja de tecidos, roupas e artigos de armarinho. Seu vizinho era um libanês bondoso que então enfrentava dificuldades financeiras e queria passar a loja. Havia um candidato a comprá-la. Era um árabe, rival e concorrente dele, que oferecia uma importância ínfima pelo negócio e, ainda por cima, criava dificuldades para todos os candidatos que apareciam para comprar.
      O libanês foi a meu pai, que todos chamavam de Chico, e disse:
-  Chico, estou desesperado. Meu vizinho está me quebrando e tudo com preços baixos, atrapalhando a venda da loja. Ajude-me! Dê-me uma idéia. Conheço-o há cinco anos e sei de sua bondade e inteligência. Faça-me esse favor!
      Meu pai então lhe disse:
-  Farid Habib-esse era o nome do lojista-, sexta-feira vou ao Rio convidar um grande amigo para passar o fim de semana em minha casa. Ele se chama Salvador Esperança. É um importante e respeitável atacadista de tecidos. Com a ajuda dele, tenho certeza de que vamos dar um jeito no seu caso.
      Domingo, o atacadista chegou. Pernoitou na casa de meu pai e, na segunda-feira, fez o que este lhe pedira. Chegou à loja de seu Habib e o cumprimentou. Conversou com ele uns dez minutinhos e saiu. Na calçada, ostensivamente começou a medir a frente da loja para saber mais ou menos a sua metragem. O vizinho que queria comprar o negócio do libanês-de nome Hamed-reconheceu o atacadista.Vendo Salvador Esperança entrar na loja de meu pai e balançar a cabeça como quem diz “a loja me serve”, ficou gelado. Quando meu pai e o atacadista foram almoçar, o árabe correu a proucurar Habib e perguntou:
-  Habib, que é que o Salvador Esperança queria com você?
      A resposta do libanês foi a que meu pai lhe ensinara:
-  Ele foi almoçar com Chico ao voltar vamos fechar negócio à vista por aquele valor que lhe pedi.
      O árabe arregalou os olhos e não titubeou. Levou Habib a sua loja, abriu o cofre, tirou a quantia mencionada em moeda sonante e mostrou ao bom libanês, exclamando:
-  Pago-lhe o mesmo e a loja é minha, concorda?
      Dizendo que sim, satisfeito e, gozando interiormente o árabe,
Habib pegou o dinheiro e saiu o mais depressa que pôde. Saldou todas as dívidas e ficou em paz.
         Salvador Esperança sequer voltou...

             José Segal   (A noite Contou – Niterói: Sol e Mar, 1999).

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